Um pequeno pardal estava pousado no muro da varanda. Parecia
olhar, inclinando a cabeça, para o abismo que havia diante dele. Por vezes,
recuava, com leves estremeções das asas, mas logo se aproximava da borda.
Sentado, olhava-o e perguntava-me se ele saberia voar, se estaria ferido. A ave
recuava um pouco, abanava as asas e dava novos passos para o precipício. O
vento fazia-lhe tremer as penas. Tanta hesitação era sintoma de uma incerteza,
de uma falta de confiança nos seus poderes. A cena prolongou-se por alguns
minutos, até que, num súbito impulso se atirou da varanda para o espaço aberto
diante de si, estendeu as asas, bateu-as e desapareceu. Encontrou-se, naquele,
instante consigo mesmo, pensei. Não tinha outro remédio, a não ser a morte. Aos
homens, porém, é-lhe dada uma terceira hipótese entre encontrar-se consigo mesmos
ou perecer. A de viverem num limbo onde a hesitação e a contingência se tornam a
sua natureza. Não voam nem morrem, ficam a olhar o precipício encolhidos.
Talvez seja isso a natureza humana, uma longa hesitação. As sextas-feiras fazem-me
mal. O pássaro voou, mas eu apenas me deixo divagar, enquanto uma pilha de
livros se ergue perante mim e uma varejeira, que aproveitou o descuido de uma porta
de varanda aberta, choca com o vidro para retornar aos espaço livres, onde
tecerá o seu império. Vou abrir-lhe a janela.
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