Estava a ler um livro de Peter Sloterdijk com o sugestivo título You Must Change Your Life – não se pense que é uma obra de auto-ajuda, não é – quando me deparo com a seguinte consideração: A era moderna é aquela que trouxe a maior mobilização das forças humanas em prol do trabalho e da produção, enquanto aquelas formas de vida em que se deu a máxima mobilização em nome da praxis e da perfeição pertencem à antiguidade. Imagino, embora tenha uma certa propensão para imaginar coisas desfocadas da realidade, que em todos os seres humanos exista uma cesura, um buraco escavado pela tensão entre uma vida marcada pela produção e a necessidade de a dedicar à perfeição pessoal, à realização de si. Quando se fala em antiguidade, nela se devem incluir todas as sociedades tradicionais e não apenas a grega e a romana. A realidade, nos dias de hoje, tempo talvez culminante da era moderna, é a produção sem fim, com o objectivo de consumir, para se produzir mais, para se consumir mais, até ao infinito. Em tudo isto parece haver uma condenação de Sísifo, uma ausência de sentido para o facto de se estar neste mundo e ter capacidade de pensar. Se queremos encontrar uma grande razão para o absurdo na literatura de Camus ou para a náusea em Sartre, encontramo-la nesta mobilização infinita das capacidades humanas para a exterioridade produtiva. A redução da existência à dinâmica da quantidade, a que se expressa no jogo dos gastos e dos proventos, é a casa do absurdo em que a vida de muitos seres humanos se tornou. Não sei o que me deu para escrever estas coisas. Talvez seja o facto de a noite estar a cair, com a escuridão que é a sua, ou a causa terá sido o ter passado o dia em actividade produtiva intensa, embora a produção a que me dedico não sirva realmente para nada. Não tarda e terei de ligar o aquecimento. Isto, sim, é uma questão importante.
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