quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Resiliência

Voltamos para o estado de calamidade. Parece que o vírus tem uma grande resiliência, como se tornou moda dizer. A sua manifestação é atacada, mas ele logo se recompõe do choque e não perde o equilíbrio emocional. O que lhe permite voltar a infectar. Resiliência é uma palavra que me irrita sobremaneira, tal como empreendedorismo. Não querem dizer rigorosamente nada, não passando de chavões na comunicação social.  Como, num outro contexto, alguém dizia – alguém que já não recordo – são significantes sem significado. Um significante sem significado, na linguagem falada, não passa de um flato. Abre-se a televisão e descobre-se, abismado, que muita gente importante sofre de um estado crónico de flatulência, tantos são os significantes sem significado que debita. Se fosse dono de uma farmacêutica tentaria criar um Aero-Om linguístico, passe a publicidade. A toma deveria ser compulsiva. Pessoa que falasse, na comunicação social, em resiliência, empreendedorismo e coisas semelhantes teria de tomar quatro comprimidos por dia, após as refeições. O ambiente tornar-se-ia menos pestífero, a língua agradecia e, mesmo que isso não fosse condição suficiente para chegarmos ao paraíso, contribuiria decisivamente para dele nos aproximarmos. Não fosse o caso de estar proibido de falar de política pelo autor, este narrador teria imensas soluções que melhorariam a vida das pessoas. É o que faz os narradores estarem subordinados ao seu criador, os quais são despóticos e falhos da misericórdia divina. Deus criou o mundo e deu ao homem liberdade para fazer o que entendesse. Os autores criam os narradores, mas em vez de lhes dar rédea solta, enchem-nos de proibições. Não falas disto, nem daquilo, nem daqueloutro. Seja como for, oiço agora a minha neta mais nova numa sessão online com a avó. O assunto parece ser a Geometria. Espero que pequena seja resiliente. O que vale é que comprei Aero-Om.

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