Não sei o que fiz deste sábado. Levantei-me bem cedo e estive a trabalhar até às dez horas. Saí e fui tratar de uns assuntos familiares. Regressado para almoçar, nem dei pelo passar das horas. É deste modo que se dissipa a vida. O tempo passa e nem por ele se dá. Já é noite cerrada há muito. Vista da janela, a rua não passa de uma fantasia fantasmagórica, pontilhada por luzes brancas e amarelas. O bosque da escola ao lado é apenas uma sombra negra e densa, as árvores da rua – tílias, acácias, liquidâmbares – dançam empurradas pela música do vento, enquanto, em estranho strip-tease, deixam cair, uma a uma, as folhas mortas. Por vezes, a avenida é cortada pelos faróis de um carro, mas o trânsito é pouco, vagaroso, alguém que procura chegar a casa, embora sem pressa. Um carro estaciona, sai um casal e precipita-se para o bar da esquina. Há pouco, sem imaginação para melhor, estive a ver um jogo de snooker. É quase tão espectacular como um jogo de xadrez, apenas um pouco menos imóvel, pois os jogadores levantam-se e sentam-se, andam à volta da mesa, onde correm bolas para dentro de buracos empurradas por varapaus a que dão o nome de tacos. A humanidade, honra lhe seja feita, de tudo faz um jogo, talvez porque esteja cansada de coisas sérias. Inventado o jogo, logo é tornado em coisa séria, para que seja inventado outro, antes que o tédio seja mais eficaz que as alterações climáticas e acabe com a espécie. Como se vê, estou sem assunto e ainda não foi hoje que falei da minha aventura, no outro dia, no palácio da justiça local. Fica para a próxima.
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