O meu dia, exceptuando os cuidados comigo mesmo, começou com uma visita a um desses templos contemporâneos, onde o ritual gira em torno da deslocação para dentro de um carro gradeado de produtos que estão tranquilos nas respectivas prateleiras. Depois, colocam-se numa passadeira para a sacerdotisa – por vezes, mas raramente, há um sacerdote – os passar por uma maquineta que devolve uma informação ao crente, dizendo-lhe o que adquiriu e o preço da aquisição. Acabada a liturgia, paga-se o ofício sacerdotal e sai-se carregado de coisas que hão-de ser consumidas, isto é, aniquiladas, reduzidas a nada. Talvez seja isto o niilismo. Outrora, não havia catedrais como aquela a que fui. Tudo se resumia a pequenas capelas e a tristes ermidas, o ritual era mais acanhado, embora não tenha a certeza que fosse mais barato. O certo é que, na pequena província, os sacerdotes desses pequenos templos acabavam por ser personagens, enquanto as vestais de hoje, as que cobram os bens e serviços, não são ninguém. Quase se pode formular uma lei. Quanto maior o templo, mais insignificante o sacerdote. Não quero dizer que, por detrás destes novos templos, não estejam cardeais poderosos. Estão, mas são invisíveis. Detestam o contacto com os fiéis, apesar de lhes deverem o cadinalato. Está um sábado ventoso, com uma luz vibrante, mas esbranquiçada. Na avenida, as pessoas ensaiam a saída da pandemia, mas fazem-no ainda com precaução. Leio que o mundo está mais perigoso, mas sobre isso estou proibido de emitir opinião, caso tenha uma.
Sem comentários:
Enviar um comentário