Esta é a última sexta-feira deste mês de Julho, que se há-de finar à meia-noite do próximo domingo, para dar lugar ao mês de Agosto, que começará numa segunda-feira. Isto mostra a incongruência que acompanha o calendário, fazer começar um mês pelo segundo dia de uma semana. Uma hipótese que tantas vezes me assombra o espírito diz que sempre que os homens tentam regular o tempo estão condenados a cair na incongruência. Regular significa impor regras. Ora, o tempo é um animal selvagem que não se deixa domar e, muito menos, domesticar. Por mais calendários que se produzam e divisões que se arquitectem, o tempo nunca deixará de espinotear e distribuir coices a quem se aproxima dele. Agostinho de Hipona – sim, o velho Santo Agostinho – teve consciência disso: Que é, pois, o tempo? Se ninguém me pergunta, eu sei; se quero explicá-lo a quem me pede, não sei. Do tempo, tem-se um saber intuitivo, mas não racional, explicativo. Dizer que que se tem um saber intuitivo não é outra coisa senão confessar uma ignorância. Uma das experiências mais comuns do carácter enigmático do tempo dá-se quando se tem já, segundo os padrões humanos, uma idade considerável. Acontecimentos que se deram há cinquenta anos parecem ter sucedido ontem, como se o tempo mal tivesse passado. Talvez o tempo não passe, seja pura imobilidade e que passado, presente e futuro não sejam mais que criações de mentes sôfregas e inquietas. Deveríamos, nesse caso, pensar o tempo como o espaço. Nós andamos pelo espaço e andamos também pelo tempo. No caso do primeiro, podemos ir e vir, apesar de ele permanecer imóvel relativamente àquele que o calcorreia. No caso do segundo, só podemos ir. O espaço é revisitável, o tempo não. Contrariamente ao que diz o título do romance de Evelyn Waugh, não é possível reviver o passado em Brideshead, pois o passado não seria mais do que um truque da memória que não se conforma com a imobilidade esfíngica do tempo. Os almoços de férias e aquilo que neles se bebe não me parecem ter o condão de aclarar o pensamento. Pelo contrário, suscitam ideias fantasiosas, sobre as quais se escreve sem ter a mínima noção do que se está a falar. Sim, confesso, também eu sofro de uma enorme falta de noção.
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