Envelhecer não significa apenas que o tempo de vida encolhe e a morte se torna cada vez mais iminente. Ao encolhimento do tempo de vida corresponde um outro encolhimento, o dos interesses. Durante toda a minha vida fui um consumidor de jornais. Um diário e múltiplos semanários. Há anos que acabei com a compra de jornais em papel, tendo acumulado três assinaturas digitais. Hoje, assino apenas um diário. Será que o leio? Comecei a explorar as minhas fidelidades e tomai consciência de que há muito só sou fiel a dois articulistas. Eram três, mas um morreu há dois anos. Mantenho a minha assinatura apenas para ler um artigo às sextas-feiras e outro ao sábado. Por vezes, leio um ou outro artigo de outros autores, mas sem fidelidade. Notícias, nunca as leio no jornal que assino. Elas estão de tal maneira disponíveis que se tornaram dispensáveis na imprensa. Imaginemos que um ministro troca as mãos pelos pés. Essa miraculosa operação é anunciada por tudo o que é sítio, não vale a pena ir ao jornal ler. Há uma coisa, porém, que faz falta em Portugal. Uma imprensa que tenha artigos que não sejam nem textos académicos, nem artigos de opinião. Esse meio termo existe em alguma imprensa internacional de qualidade, mas não entre nós. São pequenos ensaios que ajudam o público a entender a realidade. Por cá, o que interessa a quem escreve opinião é a espuma do dia, os terríveis dramas de que ninguém se lembrará daqui a meia dúzia de meses. Não faço ideia por que razão escrevi sobre isto. Terei sido assaltado pelas saudades de um tempo em que ainda se acreditava na frase de Hegel: a leitura dos jornais é a oração matinal do homem moderno. Talvez tenha deixado de ser um homem moderno e sofra, por isso, de uma estranha nostalgia.
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