domingo, 17 de julho de 2022

Blasfémias

Acabei de chegar da minha caminhada, foi o que respondi à pergunta então, o que tem feito?, que o padre Lodo disparou mal atendi o telemóvel. E prossegui, olhe já hoje obtive 55 pontos cardio. O que é isso?, perguntou-me ele a rir. O que é não faço a mínima ideia, mas a OMS assegura que obter 150 pontos cardio por semana, ajuda a prolongar a vida. Depois, de um breve silêncio disse-lhe: sabe, padre Lodo, a ordem das coisas não está lá muito bem feita. Porquê? Repare que deveríamos ter livre-arbítrio, poder escolher, respondi. E não temos? Está a blasfemar? Considere, padre, o seguinte. Se alcançar 150 pontos cardio por semana contribui para um aumento dos anos de vida, imagine agora se nos tivesse sido dada a possibilidade de obter um número infinito de pontos cardio por semana. Tornar-nos-íamos eternos. Ele emitiu uns sons que, ao telemóvel, não consegui descodificar. Continuei: só nos foi dado obter um número finito de pontos cardio por semana. Logo, não podemos escolher entre a possibilidade de ter uma vida finita ou uma vida sem fim. É capaz de me dizer onde está o livre-arbítrio? Nesta altura, começou a falar em italiano, como se estivesse a empregar o calão mais rasteiro em uso numa das grandes cidades do país onde nasceu. Sabe, acabou por dizer, eu sou um velho e, além disso, um Settembrini e tenho nos meus antepassados um número suficiente de blasfemadores para levar a sério o que está a dizer. Eu ri-me e disse-lhe que ia ter todos os meus netos comigo, que seria uma boa ideia ele vir visitar-nos. E jurei que não ensinaria às crianças qualquer blasfémia que me ocorra. Ele, claro, aceitou.

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