domingo, 29 de setembro de 2024

Um domingo na província

Está um autêntico domingo de província. A frase anterior, desconfio, é destituído de conteúdo. Não quer dizer nada, pois domingos de província deverá haver muitos e para diferentes gostos. Quanto à autenticidade, a coisa ainda é mais espinhosa. Como se poderia falsificar um domingo provinciano desde que ele esteja certificado pelo calendário e pelo mapa? Poder-se-á argumentar que calendários e mapas são coisas sobre as quais poderá recair justificada dúvida. Não são os calendários produtos convencionados pelos poderes humanos? Não são os mapas, apesar dos esforços técnicos, susceptíveis de erros? É verdade, mas devemos confiar nas convenções que subsistem há tanto tempo, assim como no trabalho técnico que insiste, em múltiplas versões, em mostrar que esta cidade, que se engrandeceria caso fosse promovida a vila, não é a capital deste velho país, um dos mais velhos do mundo, saliente-se. Confiantes na gestão tradicional do tempo e do espaço, dizer, quando se está na província a um domingo, que está um autêntico domingo de província é falar – neste caso escrever – para não estar calado. Talvez seja o resultado de um almoço em família ou com parte da família. O resultado é a rasura dos assuntos. Contudo, posso contar uma coisa. Descobri há dias um autor polaco com o nome Stanisław Ignacy Witkiewicz (1885-1939). Terá sido um génio de múltiplas facetas. Pintor, dramaturgo, romancista. Além disso ainda realizou um filme e escreveu sobre Filosofia da Arte. Fazia parte do imenso oceano da minha ignorância. Parece que o seu romance Nienasycenie (Insaciabilidade), de 1930, é uma obra-prima modernista. Não está traduzida em português e de polaco sei tanto quanto de chinês. Poderia encomendar a tradução francesa, o que, por precipitação, fiz. Repousa diante de mim. Contudo, ocorreu-me outra estratégia. Como as obras Witkiewicz estão no domínio público, talvez as conseguisse encontrar num site polaco. O que confirmei em pouco tempo. O passo seguinte foi ir traduzindo, com a ajuda da inteligência artificial, o romance para português. Está traduzido cerca de um quarto das quase seiscentas páginas do romance original. Mais uns dias e estará completamente traduzido. Lê-lo-ei em português. O resultado da tradução automática é melhor, muito melhor do que poderia esperar. Por vezes, comparo um ou outro trecho com a tradução francesa e vejo que o chatbot se sai bastante bem. Não será perfeito, mas eu também não. E nesta tradução foi-se parte do meu domingo autenticamente provinciano.

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