Voltou a segunda-feira. Os dias da semana têm este problema, substituem-se uns aos outros com inexcedível regularidade e uma monotonia sem fim. O mais curioso é que a sua invenção propunha-se pôr fim a uma outra monotonia, a da indiferenciação dos dias, os quais se seguiam uns aos outros sem nada que permitisse distingui-los. O Sol nascia, fazia a sua jornada e punha-se, como quem entra no quarto para se deitar e dormir. O pior seria a sensação de que os dias iam diminuindo e que poderiam soçobrar na noite eterna. Há muitas coisas que seria muito interessante, embora ocioso, saber. Imaginemos os nossos antepassados de há cinquenta mil anos. Como se relacionariam eles com o dia e a noite, com a passagem das estações ou com as metamorfoses da luz? Sabemos hoje, graças à análise genética, que sapiens sapiens e neandertais se cruzaram e que parte da humanidade possui genes dos neandertais. Esse cruzamento ter-se-á dado há dezenas de milhares de anos, mas parece não ter ficado registado na memória colectiva, na tradição. Sabemo-lo por recurso técnicas analíticas muito sofisticadas. Isto coloca um outro problema, que é o da duração da memória colectiva. Quanto tempo permanecem, cifrados em mitos e lendas, na memória colectiva acontecimentos memoráveis? Quando penso nisto, tenha sempre uma sensação de tristeza pela ignorância efectiva sobre quem somos. Sabemos alguma coisa até há alguns milhares de anos, mas depois o véu do esquecimento é cada vez mais negro, como se uma parte do que somos se devesse ocultar, talvez para que possamos viver com o que somos.
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