sábado, 28 de setembro de 2024

Ciência na enfusa

Alguém terá confundido ciência infusa com ciência na enfusa. Eis um equívoco desagradável. Por aqui, chama-se enfusa – não se diz, nesta terra, infusa, embora se possa, ou talvez deva, escrever e dizer – a uma espécie de bilha que se enche com água, eventualmente, com outros líquidos. Aliás, nunca cheguei a perceber a diferença entre bilhas, cântaros e enfusas ou infusas. Também, seja dita a verdade, nunca me interessei pelo assunto. Deixemos de lado os preâmbulos e as taxionomias dos recipientes para transportar líquidos e entremos no assunto mesmo. A ciência infusa é aquela que, transcendendo a compreensão humana, Deus decide infundir num mortal eleito. É uma ciência do outro mundo. Já a ciência na enfusa é aquela que um mortal, esquecido de Deus ou esquecido por este, acumula numa espécie de cântaro – aqui chamado enfusa, recordo – que é a sua mente. A primeira é um dom, a segunda, um vício. A realidade diz-nos que são poucos os casos de ciência infusa, mas são legião os casos de ciência na enfusa. Esta, note-se, não é bem uma ciência, como o são a Física, a Química. Trata-se mais de uma recolecção abundante de informações variadas, sem estruturação digna desse nome, cuja utilidade cognitiva é nula e ainda menor é a sua utilidade prática. Tudo isto para dizer que aquilo que se pratica aqui é uma forma severa de ciência na enfusa, já que este narrador – e ainda menos o seu autor – não foi agraciado (de receber a graça) com a ciência infusa.

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