Olho para o relógio e sinto na face um ricto de desagrado. A tarde correu mais depressa do que tinha pensado. O almoço prolongou-se, sem que uma fronteira definida o colocasse perante um fim imperativo. Nestes dias em que os grilhões do dever se abrem para criar uma ilusão de liberdade, relógios e calendários são tomados por uma imprecisão nefasta, banhando-se no negro oceano da vagabundagem. O tempo, assim liberto da vigilância apertada, é tomado por um galope desenfreado, como se fugisse de uma maldição ou perseguisse uma recompensa rara e irrecusável. São estes pensamentos que me atormentam em Agosto, o mais difícil dos meses. Viajo sempre com grande dificuldade na paisagem que este mês oferece, vítima de um dilema que ainda não estou em condições de resolver ou sequer de partilhar. Abro um livro e leio: «As raparigas mantinham-se fascinadas, com o olhar vidrado». A ideia de um olhar proveniente de olhos de vidro cativa-me de imediato. Só esse olhar poderia deter o tempo, aprisioná-lo, suspender-lhe o vício de se mover sempre para a frente. Depois, penso na infelicidade das raparigas com olhos de vidro. Comovo-me e devolvo-lhes o olhar animal que era o delas. O tempo desata logo num galope desenfreado, até que as raparigas, arrastadas pela fúria do cavalo, morrem de velhice. Lá fora, os carros passam indiferentes ao meu luto, à dor de tão rapidamente o tempo ter levado com ele as promessas do meu amor.
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