terça-feira, 1 de dezembro de 2020

No último mês do ano

Como quem não quer a coisa, o ano entrou no seu último mês. Hoje é feriado. Comemora-se a hora em que se decidiu acabar com o domínio de um rei castelhano. O acontecimento já não comove ninguém. Dei uma vista de olhos pelas primeiras páginas dos jornais. Apenas o i aproveita a ocasião para ouvir o melancólico pretendente ao trono de Portugal, que lá se encontra retratado com um boné na cabeça, para nos lembrar que será um homem da lavoura, um daqueles portugueses saudavelmente ligados à terra. Ontem, o meu neto veio, com os pais, cá a casa, já a noite tinha caído. Quando entra na sala decorada para o Natal, com a árvore e os presépios, pára a meio, abre a boca e olha espantado e encantado para o que o rodeava, não sabendo para onde se dirigir, nem o que fazer, atónito que estava. Vai ter pela primeira vez consciência de que o Natal é um tempo diferente. Talvez fosse a essa atitude que os filósofos gregos atribuíam o nascimento da filosofia. Refiro-me ao abrir a boca e arregalar os olhos, como se a vida e o mundo contivessem uma oferta de prazer que transbordaria qualquer medida. Na praceta aqui em baixo, pais e filhos desfrutam o sol do feriado. Em nenhum lado, porém, pressinto a vontade de pegar num qualquer Miguel de Vasconcelos e defenestrá-lo. Isso tranquiliza-me. É um sintoma de que nos tornámos um pouco mais civilizados. O que se passou, quando o corpo do agente castelhano caiu na rua, não foi coisa bonita de se ver. É o que dizem. Nesse dia eu não estava em Lisboa.

4 comentários:

  1. Assistir ao maravilhamento, à estupefacção de uma criança perante uma novidade é das melhores coisas do mundo: só por isso já vale a pena ter nascido, não é?
    E então se for um neto...
    Espero que o momento tenha ficado registado, para que ele, mais tarde, se possa também maravilhar com a sua descoberta do Natal.

    Bom Dezembro, HV.
    🎄
    Maria

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    1. Acho que não ficou. Eu não tinha o telemóvel comigo e fiquei de tal modo espantado a olhar para ele, que só me ocorreu já o primeiro impacto se tinha dissolvido.

      Um bom Dezembro, Maria

      HV

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    2. Vai ficar gravado na sua memória, e o HV vai descrever-lhe a cena tantas vezes que ele vai lembrar-se sempre: aconteceu comigo e com um menino, num Natal há mais de 40 anos, e ele ainda hoje se recorda.

      Boa noite, HV.
      🍂
      Maria

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    3. Possivelmente, vai ser assim.

      Bom dia, Maria

      HV

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