segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Sem agenda

Chove. Vejo as gotas de água dançar e, depois de uma hesitação, precipitarem-se para terra. Ao poisar, fazem pequenos lagos ou ribeiros incipientes. Pessoas passam abrigadas em guarda-chuvas, alguns com anúncios coloridos, outros mais sisudos. Há quem corra e entre num carro ou num café. Falta uma semana para que o Inverno chegue, mas ele já cá está há algum tempo. Faço uma lista de compras e outra de afazeres. Nem sei para que as faço, pois não tenho qualquer intenção de olhar para elas. Nunca tive uma agenda. Isto não é completamente verdade, mas as que tive nunca me serviram para nada. Até hoje não me fizeram falta. Vou a onde tenho de ir, faço o que tenho a fazer. Desconfio, porém, que não tarda e ser-me-ão de grande auxílio. Este ano, pela primeira-vez, esqueci o aniversário da minha sobrinha-neta. Passada uma semana, lembrei-me e achei o esquecimento um mau sinal. Apesar da chuva e das nuvens escuras, há momentos de reverberação, como acontece com certas lâmpadas que emitem um clarão intenso antes de se fundirem. Não tarda, e o dia funde-se. Nos sites noticiosos continua a contabilidade dos mortos. Os números são desagradáveis, mas ninguém quer saber. Os jornais começam a fazer a revista do ano, como se este fosse um ano que merecesse revista. Às segundas-feiras falta-me sempre assunto. Nos outros dias, também. Se dormisse uma sesta, ainda que tardia, tudo melhorava, mas não sou capaz.

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