Chega a ser penoso. Pobre S. Pedro. O santo orientador do bom andamento das coisas meteorológicas perdeu a tramontana. Presumo que antigamente (pois antigamente tudo correria pelo melhor, desde que não estivéssemos lá) ele geria com zelo e eficácia os humores do clima. Agora, a idade tornou-se uma fonte de contínua desorientação. Troca constantemente os pés pelas mãos. Hoje, segundo se sabe, é o primeiro dia de Verão. Fui presenteado (é um presente e uma bênção celestial) com um dia de Inverno. Chuva, vento e frio. Mesmo que este desconcerto tenha, para mim, em dias como o de hoje, uma vantagem, não posso deixar de ficar perturbado com o que se está a passar. Cada vez mais o clima parece retirar-se de uma pacífica e tranquilizadora cadeia de causalidade para entrar no inferno da aleatoriedade. Dantes, pensava-se que os meteorologistas falhavam as previsões porque não estavam na posse de todos os dados e de todas as leis que regulariam a evolução do estado do tempo. Hoje, começamos a desconfiar que não existe qualquer lei, que tudo se passa ao acaso. Um dia de Inverno tanto pode suceder no Inverno, como no Verão. Talvez S. Pedro decida as coisas fazendo rolar um dado onde estão inscritas as estações do ano, havendo duas faces onde está escrito: tempo sem estação adequada. Em cada dia ele faz rolar o dado e assim determina o estado do tempo que nos cabe aqui. Talvez se tenha tornado, em segredo, adepto do Princípio da Incerteza de Heisenberg, que pode ser formulado do seguinte modo: quanto menor for a incerteza do Santo na administração das chaves do céu, maior será a incerteza na gestão do clima. Consta que Einstein – e Einstein é uma autoridade – terá afirmado que Deus não joga aos dados. É um facto. Deus não tem corpo, logo não tem mãos. Sendo assim, não tem como agarrar num dado e fazê-lo rolar sobre uma mesa. Mas se Deus não joga aos dados, em lugar nenhum está escrito que um santo não o possa fazer. Perante o enigma de o primeiro dia de Verão ser um dia de Inverno, apresentei um argumento para a melhor explicação, que não deixará de convencer o mais céptico dos leitores. É aquilo a que se poderia chamar uma argumentação a que não falta cogência. E anátema seja quem discordar.
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