domingo, 6 de novembro de 2022

Código genético

Talvez este ano não exista o Verão de S. Martinho, pensei ao consultar as previsões meteorológicas. Será um Outono dentro do Outono. Seria pior, para os amantes da época, se fosse um Inverno dentro de um Outono. Está um domingo perfeito de província. Nada bole. O vento suspendeu a actividade, a luz do dia, talvez pela carestia das fontes energéticas, reduziu-se ao mínimo, as pessoas, se por acaso põe um pé fora de casa, fazem-no com inusitada lentidão. Domingos como este são um sintoma de que na natureza, incluindo a humana, existe uma tendência para a hibernação, embora recessiva. O que introduz um tema tão interessante como a discussão do sexo dos anjos ou das categorias em que estes se dividem. Trata-se do código genético dos elementos não vivos da natureza. O código genético da luz do sol, da chuva que cai, do vento que sopra. Argumentar-se-á que código genético é uma característica dos seres vivos, não dos elementos da natureza não vivos. Nunca em nenhum foi encontrado. É verdade, mas pode-se chamar a atenção que talvez isso seja uma falácia. O facto de não ter sido encontrado não é sinónimo de que não exista. Podemos imaginar que se poderá fazer a atribuição de código genético aos elementos não vivos do universo por transposição metafórica. Falar-se-ia então do ADN da luz de domingo, isto significaria que a luz dos domingos teria certas características determinadas e determinantes. O problema nesta teoria é que o domingo não é um ser natural, mas uma invenção humana. Será que as invenções humanas, como este copo pelo qual bebo água, terão ADN? A transposição metafórica que serve para os elementos não vivos da natureza, por certo poderá ser estendida aos artefactos humanos – ou mesmo não humanos – que não deixam de ser coisas na e da natureza. Uma das características vindas no código genético da luz de domingo é que afecta o cérebro de quem se põe a escrever coisas sem qualquer nexo, como se este fosse um lugar para ficções mais ou menos científicas. Talvez a culpa esteja no facto de a própria expressão código genético ter uma natureza metafórica. Sempre posso dizer que foi a ciência que começou a ficcionalizar e que eu apenas acrescento uns corolários mais ousados. Como se prova, a luz deste domingo não me ajuda.

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