Num ensaio de 1939, Vanguarda e Kitsch, Clemente Greenberg sugere que o kitsch é uma forma de arte sintética, na qual o artista digere a arte para o espectador, poupando-lhe o esforço, fornecendo-lhe um atalho para o prazer da arte que evita o que é necessariamente difícil na arte genuína. Este texto constata já a ruptura, nunca mais ultrapassada, entre arte e grande público. O grande público, cada vez mais, espera o que é fácil, aquilo que lhe provoca, de modo imediato, prazer. Os artistas, porém, procuram o difícil. Fazem, de certo modo, da arte um programa de interrogação sobre o real, procuram ir para além das aparências, para esse reino tão adverso à experiência sensível e ao sentimento que procuram rápida satisfação. Também as relações entre as pessoas deveriam ser assim, asseverou-me, um dia, Eduína. No amor e na amizade, não os confundo, acrescentou, devemos apenas buscar aquilo que é difícil, o que se esconde para além das aparências. Respondi-lhe fazendo notar que a imersão nessas paisagens desconhecidas dos sentidos e dos sentimentos não assegura mais autenticidade do que navegar por aquilo que é conhecido, conforta a sensibilidade e exalta o sentimento. O amor e mesmo a amizade serão do domínio do kitsch, vivem da facilidade. Estava a provocá-la. Por isso, respondeu, interditei-me o amor e relativizo a amizade. É a minha forma de mergulhar no difícil e evitar o kitsch na minha existência. Preciso do esforço e este não se compadece com certos estados de alma. Encontrei estas linhas num velho caderno datado de Setembro de 1992. Não se trata de um diário, mas de um registo de coisas que gostaria de não esquecer. Há notas sobre vinhos, indicações sobre livros a ler, resenhas de filmes, descrições de conversas havidas. Uma delas era esta, que se prolongou muito para além do que aqui escrevi.
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