Na edição de 2007, da Bertrand Editora, das Elegias de Duíno e dos Sonetos a Orfeu, o nome em destaque não é o de Rainer Maria Rilke, mas o de Vasco Graça Moura. O tradutor surge como mais importante do que o autor. Talvez a ideia seja de que não é possível traduzir poesia, mas esta pode ser reescrita e, nesse caso, o reescritor é o autor. Peguei no quarto soneto a Orfeu, aquele que começa por O ihr zärtlichen, tretet zuweilen (Ó vós ternos, por vezes entrai) e, desconhecendo a língua, pedi uma tradução automática. Uma tradução automática rasura o poético do poema, mas devolve-nos imagens e materiais semânticos usados na construção original. A tradução de Vasco da Graça Moura propõe um novo poético, adaptado à língua portuguesa, do soneto de Rilke, mas trabalha com imagens e materiais semânticos provenientes, como não podia deixar de ser, de Rilke. Podemos discutir, e tem-se discutido, se na poesia o essencial é o som ou o sentido. Ora, nos poemas de Rilke, por certo, a grandeza nascerá de uma combinação entre som e sentido. O trabalho de tradutor de Vasco da Graça Moura é pessoal na dimensão sonora, mas tem uma dívida impagável ao sentido construído por Rilke. A capa da Bertrand Editora é uma tomada de posição sobre a discussão entre som e sentido, proclamando visualmente que o som é mais decisivo na poesia do que o sentido. Uma tomada de posição excessiva, parece-me.
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