Há títulos de livros extraordinários. Por exemplo, The Fragility of Goodness, de Martha C. Nussbaum. Contudo, a tradução para português deixa de funcionar. A Fragilidade da Bondade perde o impacto sonoro devido à repetição das duas sílabas finais de fragilidade e de bondade. Um expediente seria traduzir por A Fragilidade do Bem, mas não seria a mesma coisa. Aliás, a tradução existente em português, na variante brasileira, faz a tradução literal. Martha C. Nussbaum não é apenas uma muito interessante e talentosa filósofa, mas é uma criadora de títulos excepcional. Além do citado, vejam-se os seguintes: Cultivating Humanity; Political Emotions; Frontiers of Justice; Upheavals of Thought; Not for Profit; The Cosmopolitian Tradition. Poder-se-á pensar que a natureza retórica destes títulos é uma estratégia comercial. Imagino que a autora se ofenderia. A qualidade linguística estará ligada, de alguma forma, à qualidade do pensamento. Os primeiros textos filosóficos completos que nos chegaram são os diálogos platónicos. Aquilo que que foi escrito antes, e foi alguma coisa, perdeu-se ou permaneceu em forma fragmentária. É possível pensar que esses textos pré-socráticos, é assim que se chamam, teriam qualidade poética e retórica. Os textos de Platão, os diálogos filosóficos, nasceram de uma ruptura dentro do próprio filósofo. Este era um jovem escritor de tragédias, mas fascinado pela figura de Sócrates, de quem queria ser discípulo, aceitou a imposição deste e destruiu as tragédias que tinha escrito. Contudo, não se conseguiu livrar completamente de si mesmo e passou do teatro trágico ao teatro filosófico, onde encenou as aventuras da própria razão. Para tornar as coisas mais interessantes, não são poucos os diálogos onde, ao lado de uma exploração racional de um problema, Platão constrói ou usa mitos. Poder-se-á pensar, e haverá quem o pense, que esses mitos, tal como os belos títulos da contemporânea Martha C. Nussbaum, têm um efeito retórico, quase de natureza comercial. Imagino que Platão ficaria ofendido. A beleza do título ou o encanto dos mitos fazem parte da verdade, que recusa revelar-se caso não haja um módico de beleza. Dessa beleza que a arte do século XX e XXI expulsou de si mesma, numa confissão de que se tinha divorciado da verdade, mas que, apesar do desígnio de muitos artistas, essa beleza acaba por voltar, contra a vontade dos próprios.
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