Em Vico encontramos uma explicação em plano inclinado para a dificuldade que se tem perante os mitos, propriamente, os mitos da antiguidade clássica greco-latina. O autor italiano não usa mito, mas fábula, que traduz a palavra grega para mito. Por que razão se tem dificuldade em crer nos mitos? Eis a explicação. Eles nascem geralmente indecentes e, por isso, tornam-se impróprios, o que significará que estão alterados, o que os faz inverosímeis, o que dá lugar a que se tornem obscuros, o que conduz a que se tornem escandalosos, o que terá como consequência que sejam inacreditáveis. Encontramos um grupo de avaliações morais, são histórias indecentes, impróprias, escandalosas. Encontramos um grupo de avaliações epistémicas, são histórias inverosímeis, obscuras e inacreditáveis. O eixo em torno do qual giram estas duas rodas de avaliação dos mitos é a alteração. Os mitos são escandalosos e inacreditáveis porque estão alterados. Originariamente, escreve Vico, seriam narrações verdadeiras e severas, ainda uma avaliação epistémica e uma avaliação moral. Ora, em torno de que eixo giram estas duas avaliações? O eixo é a origem. Na origem, as narrativas dizem a verdade e expõem a conduta séria e rigorosa. Depois, quando o comboio do tempo traz as coisas e as narrações para cada vez mais longe dessa origem, mais elas se degradam moralmente e se tornam, ao nível do conhecimento, inacreditáveis. Repare-se, ainda, numa subtil distinção. Na origem, os mitos são verdadeiros e severos, mas nascem indecentes. Uma coisa é a origem e outra é o nascimento. O que nos leva a supor que a gravidez mítica é um processo de duvidosa moralidade que transforma uma história severa e verdadeira numa indecência inverosímil.
Sem comentários:
Enviar um comentário