quinta-feira, 22 de março de 2018

Anoitecer


Arrefeceu. Ao início da tarde parecia que a Primavera tinha triunfado, mas com o declinar do dia uma súbita saudade do Inverno tomou conta das ruas. As pessoas encolhem-se um pouco como se isso servisse de esconjuro contra o frio e seguem os seus caminhos, como se nelas houvesse um propósito, uma causa final que as movesse e desse sentido à vida. Parei no passeio e deixei-me ficar a olhar o que se passa na avenida. As árvores ainda estão despidas, noto. A iluminação pública já invadiu a atmosfera e a noite, tecida de tafetá escuro, prepara-se para, gloriosa, cair sobre o dia moribundo. O melhor será ir para casa, pensei, enquanto alguém me acenava ao fundo e, de imediato, desaparecia devorado pela pobre penúria da escuridão. Uns adolescentes passam do outro lado rua como se tivessem toda a eternidade pela frente, riem alto e assustam um gato que, desconfiado, se esconde debaixo de um carro estacionado. É noite.