quarta-feira, 6 de abril de 2022

Maus sinais

Os sinais não são os melhores. Acabei agora uma longa conversa telefónica com um velho amigo dos tempos de faculdade. Foi, literal e metaforicamente, uma conversa de velhos. Aferimos as ameaças que se erguem no horizonte, a forma como o mundo parece estar a enlouquecer, o modo como os loucos, com ideias de grandeza, em vez de serem internados em hospícios, são eleitos para condutores de povos, como uma certa visão do mundo civilizada está a dar lugar a coisas insistentemente perigosas, a delírios que se não conduzissem a tragédias inomináveis seriam motivo de umas boas gargalhadas. A verdade, dizia-me ele, é que nunca estamos predispostos a admitir que gente enlouquecida pode chegar ao poder. Uma ingenuidade. Nessa altura lembrei-me de um dito de uma pessoa com quem trabalhei há umas décadas. Ingenuidade depois dos quarenta não é ingenuidade, é burrice. É isso que sinto. Fui demasiado burro ao crer que as coisas no mundo sempre se podem compor. Não podem. Uma conversa de velhos. O pior foi, porém, outra coisa. Quando fui à cozinha dei com uma chávena de café cheia ao lado da respectiva máquina. O café estava frio. Comecei a tentar perceber quem se teria esquecido de tomar café depois de almoço. Terei sido eu, perguntava-me, mas não sabia. Há pouco fui informado de que o esquecimento era da minha autoria, aquele café era meu. Não faço ideia por que razão o deixei ali. Hoje esqueci-me de tomar um café já tirado. Não tarda e esqueço que bebo café. Os tempos andam interessantes e isso está longe, muito longe, de ser uma boa notícia.

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