Chegámos ao quarto mês do ano. Uma efeméride conhecida pelo Dia das Mentiras. Não sei se ainda é prática, mas antigamente os jornais, tanto de informação geral como de informação desportiva, tinham a sua mentira para comemorar o evento. Tanto quanto me lembro, a mentira era fácil de descortinar e ainda não havia o hábito de recorrer à prática do fact check. Também as pessoas – algumas, claro – se esforçavam por contar uma mentira aos seus conhecidos. Não sei qual foi o destino deste velho hábito, ainda por cima num mundo onde a mentira tem tanto valor quanto a verdade. Tem-se a sensação de que todos os dias são dias da mentira, portanto não valerá a pena sublinhar o primeiro de Abril. Na caixa do correio estava um livro de Martha C. Nussbaum, com o título The Monarchy of Fear, um excelente título, diga-se. A filósofa pensa sobre o caso dos Estado Unidos, mas o medo está a estender os seus tentáculos um pouco por todo o mundo. Estamos a passar de uma monarquia para um império, o império do medo. Talvez o comboio da existência tenha descarrilado em algum lado e, agora, toda a gente entre na carruagem com temor e tremor, implorando para que o maquinista saiba o que está a fazer. Nussbaum cita, a certa altura, Lucrécio, quando este se refere aos deuses, não são escravizados pela gratidão, nem manchados pela raiva. Talvez os antigos pensassem os deuses como modelos arquetípicos dos homens. A verdade, porém, é que dificilmente os seres humanos se aproximam desses impassíveis modelos. A mancha da raiva cresce facilmente nos seus corações, uma raiva movida pelo medo. Este leva à mentira e, por isso, haver um dia consagrado ao acto de mentir não faça já sentido. Há que inventar uma outra efeméride, para que o primeiro de Abril tenha a comemoração adequada aos novos tempos, aqueles em que o medo cresce por todo o lado e se transforma em manchas de raiva.
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