Num discurso pronunciado em 28 de Abril de 1962, aquando da recepção, em Bruxelas, do Prémio Erasmo, o teólogo alemão Romano Guardini faz uma meditação sobre a Europa. Parte da sua experiência pessoal: nascido em Itália, de pais italianos, muito cedo foi para a Alemanha. Em casa, falava italiano, mas toda a sua formação foi feita em alemão. A certa altura do discurso, diz: Pensava em alemão, pois não é em vão que se pensa numa língua. Ora, uma língua não é, em primeiro lugar, um sistema comunicacional, embora também o seja. Uma língua é a estrutura do mundo que habitamos, uma estrutura que preexiste ao falante. Numa linguagem mais filosofante, é uma estrutura a priori. Um transcendental, isto é, uma condição de possibilidade. O mundo de um alemão não é o mesmo de um italiano ou de um português, muito menos o de um árabe ou de um chinês. Isto porque toda a experiência está enformada pela língua em que se pensa. Bernardo Soares, num dos textos mais antipatrióticos da literatura portuguesa – Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incomodassem pessoalmente. – escreve: Minha pátria é a língua portuguesa. Pátria significa aqui mundo. Guardini, na sequência do discurso, afasta-se da questão da linguagem. Ora, é aí que reside o drama europeu. Não porque a comunicação seja difícil – é facílima no mundo de hoje. O problema é existirem tantos mundos europeus quantas as línguas faladas pelos habitantes da Europa. Se houvesse apenas uma língua na Europa, o europês, haveria apenas um mundo. A realidade seria mais pobre; mas a vida, mais fácil.
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