A certa altura, uma altura recente, da história da humanidade iniciou-se um culto fervoroso pelo progresso, pela evolução do homem. Uma autêntica religião, embora cindida em diversas igrejas, com a sua liturgia, os seus rituais e os seus sacramentos. O século XX foi, porém, uma época propícia para o cultivo da dúvida. O agnosticismo e o ateísmo em relação à evolução da humanidade cresceram, reduzindo o número de fiéis e ainda mais o de praticantes. Da crença na evolução, ficou apenas a certeza do progresso da técnica e um medo terrível de que a moralidade humana estivesse longe de ser capaz de acompanhar o ritmo do desenvolvimento técnico. Este culto público do progresso e da evolução da humanidade sempre foi acompanhado de um outro culto, com raízes muito antigas, mas de natureza quase secreta. Há quem acredite que os seres humanos não estão em evolução, mas em involução. Desde há muito que vivemos numa fase de regressão da nossa humanidade. Em tempos, todos os seres humanos teriam sido mais sábios e sensatos, a vida entre eles era justa e aprazível. Depois, entraram num processo de decadência que se vem acelerando ao longo do tempo. Poder-se-á mesmo afirmar que, para esses cultores da regressão, o progresso técnico é inversamente proporcional à qualidade da humanidade. Quanto melhor a humanidade, menos necessidade da técnica ela tem. Quanto maior recurso à técnica, pior é a humanidade. Estas duas perspectivas têm o condão de sublinhar a necessidade que temos de contar histórias e, ainda mais, de contar histórias que permitam contar todas as outras. Estas duas histórias contadas aqui são histórias enquadradoras, são elas que permitem que contemos todas as outras, sejam elas quais forem. A dificuldade, a minha dificuldade, é que não sei em que campo hei-de enquadrar a história deste domingo. Será a história de mais um passo na evolução da humanidade ou, pelo contrário, será a prova da sua regressão. Ora, não será uma coisa nem outra, pois neste domingo não tenho nada para narrar e este é o ponto de equilíbrio, um ponto neutro, entre a crença no progresso e a fé na involução. A utilidade dos dias úteis, por certo, dar-me-á mais imaginação para encontrar assunto.
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