Movido por um comentário escutado há dias na Antena 2, tenho dedicado parte do dia à escuta do segundo quarteto de cordas de Joly Braga Santos. Vou na terceira audição. Leio que foi escrito em Milão, no ano de 1957, onde o compositor terá contactado a vanguarda musical. Ainda apanhei o comboio da vanguarda, apesar de ele ter partido de uma estação bem anterior à do meu nascimento. A certa altura, tudo era vanguarda. Na música, na poesia, na pintura, na política, na arquitectura, sabe-se lá mais onde. Aquilo que eu apanhei foi apenas a sombra dessa vanguarda. Pensamos, quando se pensa na vanguarda, na radicalidade dos pressupostos e dos projectos, na ideia de romper o tecido do tempo, para instaurar a novidade, apressar a vinda do futuro. Deus, os anjos e a própria morte, caso cada uma destas entidades exista, franziam todos o sobrolho e não cessavam de se perguntar o que se estaria a passar. Quem é que quer estar na linha da frente, quando chovem as balas? Quem é que deseja apressar o futuro, se no futuro todas estaremos mortos? A própria morte, grande beneficiária do desejo de estar na vanguarda, estava desconcertada com tanto desejo de a frequentar. A excitação vanguardista, como todas as excitações foi passando, e a vanguarda tornou-se velha, caindo na retaguarda, tentando resguardar-se da ceifeira implacável que tinha tentado seduzir. O quarteto de Joly Braga Santos ainda não se inscreve na tradição vanguardista, saliente-se. De tudo isto, subsiste, para mim, um enigma. Se os que marcham à frente estão na vanguarda e os que marcham atrás estão na retaguarda, os que marcham no meio, estão na mesoguarda?
Sem comentários:
Enviar um comentário