Cheguei tarde a casa. Um dia ocupado. Sentado à secretária, vejo as notícias sobre o que se passa no mundo. Este é um lugar onde se passam muitas coisas, mas as notícias versam apenas sobre aquela parte que os seus autores imaginam ser mais fervilhante. Os noticiadores amam a ebulição, pois tudo que não esteja no estado de fervura não será digno de se notar. A ideia destes agentes do alvoroço, caso tenham alguma, será lançar água a ferver por tudo o que é sítio. Imagino que terão uma atracção infantil pelo vapor de água. Como se poderá lidar com toda esta excitação que, a todo o instante, é semeada? As soluções possíveis são antigas. Adere-se ao epicurismo e cultiva-se a ataraxia. Tranquilidade de ânimo, moderando os prazeres, para que a animosidade não tome conta do espírito e o precipite na ebulição das inquietudes e das preocupações. Outra solução é tornar-se um estóico e aspirar à apatheia para que em nós se dissolvam as paixões, essas patologias que nos arrastam para o rígido reino da dependência. O ideal seria deixar de lado as inquietações e apagar as paixões. Se todos se tornassem um misto de estóicos e epicuristas acabariam as notícias, a comunicação social deixaria de ter o que comunicar e a vida decorreria sem que acontecesse nada digno de nota. Será nesta ausência de coisas notáveis que residirá a felicidade, a verdadeira beatitude. Imagino-me na prática de uma vita beata. O pior é que nunca deixo de ir ver as notícias, talvez porque a inquietação ainda faz parte do lote que me coube, agora que as paixões entraram na fase de cinza. O que não faz de mim um virtuoso. As sextas-feiras, depois das festividades, recobraram o seu pleno sentido, como uma promessa nunca cumprida de abrirem o caminho para o jardim do Éden. Também não era suposto, pois há que beber o cálice até ao fim. Uma fatia de bolo rei, na sua versão feminina, vai saber-me bem.
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