Como a imaginação escasseia, retorno à citação. Andrea Köhler, uma correspondente, estabelecida em Nova Iorque, do diário suíço Neue Zürcher Zeitung, tem um ensaio denominado O Tempo que Passa – Um ensaio sobe a Espera. Não o conhecia, mas vi o livro na mão de uma pessoa amiga e dei uma vista de olhos pelo conteúdo. Descobri, no início do capítulo «Desiste!», página 40 da tradução portuguesa, o seguinte: Fazer esperar é um privilégio dos poderosos. No piso da administração, onde nos deixam entregues à espera, há quem supervisione o nosso tempo e o consuma voraz e irreflectidamente. Quem nos faz esperar celebra o poder que detém sobre o nosso tempo de vida, e a dúvida sobre se não é justamente essa a razão para sermos deixados à espera é o que confere a esse poder o seu aspecto mais ameaçador. O meu conflito contumaz com as esperas nos consultórios tem aqui a sua raiz. O bem mais precioso que recebemos ao sermos concebidos é o tempo. Que outro disponha do nosso tempo a seu bel-prazer é não apenas uma humilhação, mas um ataque violento contra a nossa autonomia. Todos temos de gastar o tempo dos outros, mas há diversas formas para o fazermos. Esse gasto pode resultar de um acordo justo entre as partes. Pode também proceder de um exercício de poder daquele que se encontra numa posição superior e que, por isso, dispõe do tempo do outro. As relações entre chefes e subordinados, entre empregadores e empregados, entre médicos e pacientes, são todas elas propícias a um exercício de poder irracional fundado na disposição arbitrária do tempo do outro. Esse poder sobre o tempo dos outros pode acontecer em qualquer circunstância, mesmo as mais inesperadas. Há muito tempo, vivi durante um ano numa cidade do Alentejo. Um dia, precisava de uns parafusos, dirigi-me a uma loja de ferragens. O tempo ali passava muito devagar. A certa altura, o empregado percebendo em mim alguma impaciência, disse-me para não ter pressa, pois ele só saía dali às sete horas. Seriam pouco mais de três. Havia naquela graçola uma vingança. Ele tinha de perder o seu tempo a trabalhar para outrem e vingava-se naqueles que necessitavam do seu atendimento. Sempre que tenho um compromisso esforço-me para chegar a tempo, para não fazer o outro esperar, pois a espera não é o princípio de esperança, mas o sinal de uma distorção na relação entre seres dotados de razão, que devem respeito uns aos outros.
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