Por aqui está um excepcional dia de praia, o que, para mim, não é, de todo, uma boa notícia. Como sou dado à hipérbole, estou a exagerar. O dia está bom para fazer praia, mas isso não constitui, para mim, uma tão má notícia quanto quero fazer crer. Aliás, fui-lhe fazer uma visita. As minhas netas disseram logo que era um acontecimento: nunca me tinham visto na praia. Fiquei perplexo. Eu, que ali as levei tantas vezes, que ali brinquei com elas, e disso não ficou um vestígio na memória. Não se lembrava de me ver perto do mar, disse-me a mais nova. Ainda olhei para a mais velha, mas esta corroborou a irmã. Não sei o que fazer com esta informação. Talvez o melhor seja não fazer nada e criar uma sólida narrativa de que nunca fui com elas à praia. Será uma narrativa falsa, mas terá a aparência de verdadeira, e daí vir-lhe-á a solidez. Lembrar-se-ão do avô como aquele que nunca foi à praia com elas. Em contrapartida, não se esquecerão de que as levava, nesta altura do ano, a concertos de piano. Será justo. Não se pode sobrecarregar a memória das novas gerações. E não somos nós que escolhemos as memórias que ficarão de nós, caso fiquem algumas. Os poderes humanos são parcos e de grande fragilidade, ao contrário do desejo, que é infinito. Não tarda, terei de as ir buscar.
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