Há muitos anos, conheci alguém que tinha por máxima de vida
preservar-se do contacto com o rebanho. Era uma pessoa discreta e, por alguma
razão que eu nunca quis saber, deixou que o aforismo se lhe soltasse da boca
num ambiente relativamente público. Nesse momento dei pela sua existência. Foi
o princípio de uma longa amizade só interrompida pela morte. O rebanho, dizia,
não cheira apenas mal. Contamina-nos com o seu cheiro. E logo acrescentava que
não há coisa pior que o mau odor. Um dia, numa conversa ocasional cujo assunto
esqueci, acrescentou à sua tese uma taxinomia humana. Há quatro tipo de
pessoas, afirmou, enquanto olhava para lá da janela. As que fazem parte do
rebanho, as que são cães do rebanho, os pastores do rebanho e os inúteis, os
que não sabem balir, nem ladrar, nem possuem voz de comando ou propensão para
homilia. Esses tornam-se suspeitos e a única solução que possuem, para que
possam preservar a vida, é tornarem-se texugos. Só o mau cheiro pode combater o
mau cheiro, acrescentou não sem deixar escapar uma gargalhada.