Ainda não me atrevi a pôr um pé fora de casa. O Outono, a
minha estação preferida, chegou rancoroso, pedras de sol na mão, facas afiadas
prontas a entrar pelas costas dos mais descuidados. Noutros tempos, pelo menos
aqueles que guardei na memória, a chegada do Outono, mesmo se havia sol e
calor, era acompanhada por um sentimento de despedida. Alguma coisa estava a
acabar. O que é tormentoso não é o calor, mas chegar ao dia de hoje e
pressentir que tudo vai continuar. Um sol inclemente, as temperaturas bem acima
dos 30 graus, os incêndios a crescer dentro das florestas, o cansaço dos corpos
batidos pelo desvario solar. Chego à janela e espreito a avenida. Os prédios amolecem, as paredes exsudam, as árvores ajoelham-se à procura de água fresca.
Depois, sento-me com um romance de Cormac McCarthy na mão. Olho a capa e vejo nela
uma paisagem de Outono. Atiro-o para cima da secretária e, como um cão exausto,
rosno: estou farto de provocações.