domingo, 23 de setembro de 2018

Começou o Outono


Ainda não me atrevi a pôr um pé fora de casa. O Outono, a minha estação preferida, chegou rancoroso, pedras de sol na mão, facas afiadas prontas a entrar pelas costas dos mais descuidados. Noutros tempos, pelo menos aqueles que guardei na memória, a chegada do Outono, mesmo se havia sol e calor, era acompanhada por um sentimento de despedida. Alguma coisa estava a acabar. O que é tormentoso não é o calor, mas chegar ao dia de hoje e pressentir que tudo vai continuar. Um sol inclemente, as temperaturas bem acima dos 30 graus, os incêndios a crescer dentro das florestas, o cansaço dos corpos batidos pelo desvario solar. Chego à janela e espreito a avenida. Os prédios amolecem, as paredes exsudam, as árvores ajoelham-se à procura de água fresca. Depois, sento-me com um romance de Cormac McCarthy na mão. Olho a capa e vejo nela uma paisagem de Outono. Atiro-o para cima da secretária e, como um cão exausto, rosno: estou farto de provocações.