Um acaso levou-me a um texto escrito em português mas com um
vocábulo alemão por título. Traumdeutung,
interpretação dos sonhos. Invejo as pessoas que têm sonhos para interpretar.
Muito raramente me recordo de um e quando isso acontece, vejo-o apagar-se e
voltar para o esconso lugar de onde veio, privando-me da arte da interpretação.
Quem não tem sonhos para deles fazer hermenêutica é uma espécie de ocioso
psicológico ou, no pior dos casos, um indigente da psicologia, que nem um sonho
tem para contar. A noite chegou e aquilo que estive a fazer não me deu o melhor
dos humores. Talvez aqueles que não têm sonhos para submeter à busca da sua
significação devessem tentar interpretar a variação de humor que sofrem. O
gargalo da noite partiu-se e os demónios saíram da garrafa, saltitam pelas ruas
sempre prontos a tentar as almas que vão por aí transidas de frio. Como todos
sabem, o material das almas é muito sensível à temperatura. Muito calor, elas
evaporam-se. Muito frio, e elas encolhem tanto que o seu proprietário parece um
desalmado. Se eu tivesse um sonho para interpretar escusava de estar a falar daquilo
de que não se pode falar. O melhor é seguir o conselho do senhor Wittgenstein e
calar-me.
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