Faz hoje anos que os Braganças substituíram os Filipes no
trono de Portugal. Por muito que goste de Espanha, e gosto muito, dá-me sempre
uma boa disposição particular o facto de não ser espanhol. Depois há aquele
pormenor insidioso da defenestração do Miguel de Vasconcelos. A política tem
destas coisas, uma certa tendência para o exagero e para actos irreversíveis. Ia
contar que a execução do colaborador dos espanhóis – supremo símbolo do traidor
em Portugal – tinha sido o primeiro assassinato político de que tinha
consciência. Seria uma mentira e embora seja obrigado a mentir muitas vezes
nestes textos não o faço de propósito. O primeiro foi o de John Kennedy e ainda
recordo o meu pai a comentar o assunto com a minha mãe. O caso do Vasconcelos,
narrado numa aula da escola primária por um professor ou professora patriota,
ficou preso à imaginação pela palavra e pelo modus operandi. Não era todos os dias que se ouvia uma palavra como
defenestrar, ainda por cima aplicada a alguém que não só não merecia ir para o
céu como todo o castigo aplicado era pouco. Não se pense que falar do céu é
coisa despropositada. Lembro-me muito bem, na sequência das aulas de história
recebidas naqueles tempos em que a razão não tinha sido contaminada pelo vírus
da crítica, de ter pensado como era bom pertencer a um povo cujos governantes e
personagens históricas eram não apenas grandes heróis como pessoas
particularmente santas. Deviam estar todas na glória de Deus. Talvez o feriado
de 1 de Dezembro sirva para assinalar o caso do único português que pela sua
aleivosia foi atirado pela janela e só parou de cair quando Satanás o apanhou e
o levou para o reino dos infernos. Ainda hoje dou comigo a pensar que as nossas
elites se já não são heróicas, os tempos não estão propícios para a coragem, continuam
firmes no caminho da santidade. Pelo menos, não tem havido defenestrações.
Caramba, se há palavra que me arrepia, é essa!
ResponderEliminar~CC~
Sempre simpatizei com a palavra, embora não ache muito decente andarem a atirar pessoas ou mesmo coisas janela fora.
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