Chegámos ao tempo da verdadeira contabilidade, aquela cujas
razões se dão a conhecer não no segredo dos escritórios mas nos escaparates das
notícias. Um exercício de balanços e balancetes, onde se anota os movimentos a
débito e a crédito. Lá vêm os mortos e os que escaparam, na falibilidade que há
em toda a fuga, os infectados e os que não o estão ou ainda não o estão. Novas
rotinas instalam-se, como se nos habituássemos ao cerco que os exércitos
inimigos decidiram pôr às portas da cidade. Passei parte da manhã a enviar
emails, mensagens que não encontram destinatários dispostos a recebê-las, mas a
isso estou habituado há muito. Quem quer saber daquilo que eu tenha para
comunicar? Se fosse eu o destinatário das minhas mensagens também me recusaria
a abri-las. De mim apenas pode vir spam
e o melhor é evitar espreitar o que contêm, será por certo publicidade
enganadora. Desde ontem que não largo os ciclos de canções de Schubert, na voz
de Fischer-Dieskau. Na minha secretária está a Nova Gramática do Latim. No entanto, é apenas a prova de uma longa
hesitação. Acompanharei ou não as lições do autor no facebook? Está um dia de início de Primavera. Depois penso na
frase e descubro que ela não quer dizer absolutamente nada, como a maior parte
das coisas que digo. Num livro do poeta Daniel Jonas, leio o seguinte verso: Aqui nesta Tebaida, ouço a paz. Fico em
silêncio, pois não sei se aquilo que oiço é a paz ou a guerra. Talvez tenha
começado a ficar um pouco surdo. Hoje é sábado, dia 21 de Março. A Primavera
trouxe alguns anjos que estão sentados nos telhados. Vou à varanda acenar-lhes.
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