Os piores profetas são os da meteorologia. Ainda ontem profetizaram para aqui três dias de chuva, a começar hoje. Perderam o contacto com o deus do clima ou não têm feito as devoções devidas a S. Pedro. Resultado? Falência completa das previsões. Está um calor de ananases, um sol radiante e chuva, nem vê-la. Quando era pequeno sempre me intrigou a atenção que os mais velhos, isto é, gente do tempo dos meus avós, dedicavam à audição do boletim meteorológico. Mal sabia eu que quando chegasse à idade deles lhes copiaria a inclinação. Também é verdade que aprendi há muito, não sei onde nem com quem, que quando não se tem assunto de conversa, se deve falar do tempo. É o que eu faço. Deve-se evitar expressões como está a escachar, é de rachar, mesmo está de ananases. Pelo menos, no tempo de Eça de Queirós, não seria o modo mais civilizado de falar do tempo, mas era o que ocorria a algumas das suas personagens. Há pouco li um interessante artigo sobre aquela ideia tonta de que a expressão não há nada é um erro. Esta ideia de erro terá nascido de interpretação da língua em termos lógicos. Teríamos aqui uma dupla negação, o que era equivalente a uma afirmação. O pobre do falante queria negar a existência, mas devido à sua inépcia linguística acabava por afirmá-la. O autor, pacientemente, explica por que isto é um disparate. Cheguei a conhecer pessoas cujo desejo intelectual era eliminar a equivocidade da língua, para que esta denotasse, de forma bacteriologicamente pura, a realidade. Isto significa apenas que muitas vezes conhecemos pessoas que não são recomendáveis. O que torna as línguas interessantes não é serem uma emanação directa da lógica, que não são, mas possuírem uma lógica própria feita de múltiplos e aparentes ilogicismos, tal como é feito o pensamento e a fala das pessoas que usam a língua. Agora, vou beber água, pois não há nada melhor do que matar a sede quando se está sequioso.
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