domingo, 25 de setembro de 2022

Indecisão do mundo

Apenas uma escaramuças em torno da tabuada de multiplicar, o resumo da interacção matemática entre avó e neta. Parece que é um problema com a rapidez do cálculo mental. Acabei por imprimir as tabuadas, para sanar o conflito. Houve promessas de as decorar, embora eu tenho uma certa propensão para o cepticismo. Livres dos assuntos escolares, entregam-se, as duas – tanto a que sabe de cor as tabuadas de multiplicar, como a que não sabe e tem aspecto de não querer saber –, à realização da sua sina de adolescentes. Riem-se de coisas que não têm graça, mas que o apurado faro humorístico pós-infantil, na versão feminina, encontra sempre causa de escárnio e, não poucas vezes, de maldizer. Não tarda, vão-se embora. Está um domingo indeciso, não sabe se há-de correr para trás, para se entregar ao sábado, se se há-de deixar deslizar para segunda-feira. Também os carros que passam sorumbáticos na avenida sofrem do mesmo mal. Levam famílias que aspiram tanto à irresponsabilidade dos sábados, quanto à liberdade dos dias úteis, onde podem suspender por largas horas o convívio. Consolam-me, perante a indecisão do mundo, as palavras de Schopenhauer: Também toda a nossa existência, no conjunto e no detalhe, traz a marca da coacção: cada indivíduo é preguiçoso no fundo do coração e aspira ao repouso; mas é forçado a avançar, como o planeta em que habita, em que a força que o impele para diante impede-o de cair sobre o Sol. Somos forçados a avançar por uma força que não controlamos. Tomado como boa a analogia schopenhaueriana, avançamos para retornar ao mesmo sítio, que é aquilo que acontece à Terra. Não será bem ao mesmo sítio, pois o sistema solar também se deslocará com a galáxia a que pertence, mas ao mesmo sítio relativo. Talvez melhor fora que nos déssemos ao repouso, tal como ordena aquilo que habita no fundo do nosso coração, que é o sítio onde se encontra o melhor que há em nós, diz-se.

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