Resisto, mas o poder da realidade é mais forte que o meu ou de qualquer um que lhe resista. Realidade deriva de real, que em latim – reāle – se origina em res, que significa coisa. Há um curioso sentido de real: aquilo que é relativo às coisas e não às pessoas. Aqueles que, como este pobre narrador sem narrativa, tentam resistir à realidade fazem-no para impedir a sua coisificação, a sua transformação em coisa. Ora, parece ser o destino de qualquer pessoa transformar-se em coisa, metamorfosear-se nessa coisa que está aí. Quanto mais reais, menos pessoas somos. Portanto, a realidade é uma enorme e poderosa máquina de converter pessoas em coisas. No Antigo Testamento há uma história que confirma o que acabo de escrever. Em fuga de Sodoma, Lot e a família foram avisados para não olharem para trás. Caso contrário, seriam transformados em estátuas de sal. Ora, a mulher do sobrinho de Moisés não conseguiu suster a curiosidade e olhou para trás, para a realidade de onde fugia. Foi coisificada. Moral da história? Não devemos ter contacto intenso com a realidade, caso contrário viramos estátuas de sal ou coisa pior. Seja como for, não se pense que mergulhar no ideal e viver nesse éter sublime salva quem quer que seja de se transformar se não em estátua, pelo menos em sal.
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