A certa altura, no século XVII, desencadeia-se em França uma querela que ficou famosa, a denominada Querela dos Antigos e dos Modernos. Que tipo de arte é superior, aquela que imita os clássicos greco-latinos ou a que pretenda inovar? Como acontece nestes conflitos de ideias, as posições extremam-se e acabam por parecer incompatíveis ou mesmo incomensuráveis, como se a arte clássica e as suas imitações pertencessem a um universo e a arte moderna pertencesse a outro, e entre eles não houvesse possibilidade de estabelecer mediação. Muito curiosamente a Querela estava fundada numa exclusão, a da arte medieval, de acordo com a ideia de que a Idade Média tinha sido uma era de trevas. Havia no espírito do tempo uma propensão para a exclusão. O que fará sentido, porém, é a atitude contrária, perceber que a arte de uma certa época terá de carregar com o peso do passado, terá de apropriar-se das tradições e reinventar-se nesse solo mil vezes adubado e por isso fecundo. A que propósito vem isto? Ocorreu-me e não encontro razões conscientes para falar deste assunto, mas é plausível pensar que haverá razões inconscientes que, através dos artifícios que só o inconsciente conhece, tivessem desencadeado em mim a vontade de escrever sobre ele. Talvez, ao contrário ao dos modernos, o meu inconsciente não esteja inclinado a matar o pai, dando-lhe um lugar e fazer da arte um lugar onde o novo, o inédito, se insere num culto dos antepassados, como acontece em certas tribos arcaicas.
Sem comentários:
Enviar um comentário