Sexta-feira tornou a ser um dia de libertação e, ao mesmo tempo, de melancolia, pois sabe-se que a libertação é passageira, e as duras garras da realidade voltarão mais depressa do que se deseja. A madrugada desponta e mais um dia / Se prepara para o calor e o silêncio. No mar o vento da madrugada / Encrespa-se e desliza. Eu estou aqui / Ou ali, ou algures. No meu começo. Por mim, penso ao ler estes versos de Eliot, deixava ir o calor, pedindo ao vento do mar que o levasse para longe, e ficava com o silêncio, pois não tenho outro começo que não o silêncio. É nele que tudo começa, mesmo o ruído mais abominável ou o gesto digno do maior louvor. O silêncio é uma casa, a minha casa comprada sem prestação mensal, sem pagamento a pronto, herdada dos dias de nevoeiro ou das noites veladas à luz estelar. Caminho pelos corredores do silêncio, entro em cada um dos seus quartos, em cada uma das suas salas, e ele é sempre diferente, como são diferentes os dedos de uma mão. Há dias em que habito não o silêncio, mas o vento, um certo vento que desliza sobre a terra de um modo que só eu reconheço. Dançava diante da escola onde aprendi a ler, e por isso aprendi a ler, e se amo a leitura foi porque amei antes dela o vento que a trouxe, nesse começo que era, ao mesmo tempo, começo e continuação e, ainda, fim, mas isso eu não sabia, pois nesse tempo a sexta-feira ainda não era um dia de libertação. Tudo era então mais lento, e havia que esperar a chegada do sábado ao início da tarde, quando saía da escola, e o vento esperava por mim para me guiar à casa do silêncio, onde ouvia as vozes que dobavam, para o meu prazer, o silêncio infinito que me cabia.
*Que está a fazer o fim de Novembro
ResponderEliminarCom o alvoroço da Primavera
E de criaturas do calor do Verão,
E de campânulas brancas a torcer-se sob os pés
E de malva-rosas que chegam alto de mais,
Vermelhas depois pardas e derrubam
Rosas tardias cheias de neve temporã?*
O trovão ribomba nas estrelas revolventes
EliminarSimula carros triunfais
A entrar em consteladas guerras
& etc.