Comecei o dia da melhor maneira possível, irritando-me com a pessoa que me atendeu, através de contacto telefónico, num serviço público. Conforme ia pondo as questões, respondia-me com a ironia que se utiliza perante a insistência de estúpidos contumazes, a que se associava um tom paternalista, maternalista, no caso, para vincar a sua supina superioridade intelectual perante um representante imaculado do império da estupidez. Que eu seja estúpido, aceito-o com bonomia, pois ninguém pode fugir ao que é. Que outros me pensem estúpido, também o aceito sem reclamações. Que comentem nas minhas costas a infinita estupidez de que sou proprietário também não me levanta qualquer objecção. Que me o façam notar, isso ultrapassa a linha da vida civilizada. Eu sei que era cedo, mas a pessoa é paga para responder a questões e prestar esclarecimentos. Se está descontente por não poder, no exercício das suas funções, candidatar-se a prémio Nobel do que quer que seja, paciência, procure outra ocupação onde possa chegar à glória. Eu compreendo que a função seja de um aborrecimento mortal, que as pessoas lhe ponham mil vezes as mesmas questões, mas ninguém tem culpa da natureza esotérica da burocracia nacional, nem da inimizade para com o cidadão com que são construídos os sites dos serviços públicos. A certa altura, acabei por me irritar e dizer que ela estava ali para prestar esclarecimentos, que era essa a sua função e que também lhe cabia ter paciência para os que estão perdidos nos arcanos da literatura pública. Não foi bem assim, pois não perceberia a linguagem. A partir daí a situação tornou-se mais produtiva e os esclarecimentos foram prestados, descodificando siglas e não sei mais o quê, dando as informações pretendidas. Não há como começar a semana com um combate com um moinho de vento.
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