Envelhecer é cair na folhagem obscura de uma floresta sem
nome. Uma vez por outra sou assaltado por pensamentos destes, pensamentos em
que, como em certas filosofias, não se pensa nada, o que é um grande alívio.
Foi o que me aconteceu hoje, ao deslocar-me a uma aldeia onde, à beira da
estrada, os donos dos pomares vendem laranjas. Há dez anos, nunca pensaria
nisso, mas agora um patriotismo aldeão, atávico e despido de interesse, estende-me armadilhas
destas. O sol refulgia nas laranjas, os carros passavam mergulhados no domingo,
e a vendedora, vinda de um tempo onde nem como promessa eu seria pensado, cerzia
com cuidado o passado e o presente e oficiava, como sacerdotisa experiente e
pura, os velhos rituais da compra e da venda, dessa troca que abre caminhos por
dentro das mais obscuras e inomináveis florestas. E, enquanto regressava,
barafustando com a Antena 2 pelo programa que se lembrara de pôr no ar, só para
me irritar, constatei que não há nada como a economia de mercado.