sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Sem promessas

Sento-me na plateia e olho um palco coberto de vociferações. Habitar o mundo é um ofício que exige uma infinita paciência. O Inverno vai a meio, constato, mas há momentos que já trazem o odor melado da Primavera. Eu sei, pois há muito que estou sentado no mesmo sítio, que se exulta com os eflúvios desses dias em que a natureza há-de florescer, entre o orvalho das manhãs e o zumbir dos insectos, para que os corações amoleçam e os instintos se disfarcem no fervor de uma écloga. Por falar em pastores, o mau gosto é um lobo que nunca deixa de rondar os rebanhos. O vento insiste, com as suas artes rasteiras, em precipitar-se contra a minha janela. O vidro reluta e apenas deixa entrar a cinza da tristeza que se desprende da paisagem. Ao longe, voam dois corvos mas não os oiço crocitar. O fim-de-semana começa viscoso, esburacado e, como eu, sem promessas para o dia de amanhã.