Um brruuum contínuo
está apostado em estragar-me os poucos momentos que tenho para aqui estar. Decorrem
obras no lugar onde existia uma agência bancária que, tomada de inquietação, se
cansou de estar onde estava, no rés-do-chão deste prédio. O cansaço dos bancos
nunca é coisa que tenha bons resultados. Em vez de haver lá por baixo pessoas
com ar grave a tratar de negócios em surdina, temos gente armada de berbequim que
fez uma promessa de propagar dores de cabeça pelo prédio inteiro. O mundo nunca
se cansa de nos fazer reparar na sua imperfeição. O brruuum persiste e mistura-se com o som de um alarme, os latidos de
um cão e os gritos de adolescentes que correm à chuva. Não tarda e há-de passar
uma ambulância com a sirene a multiplicar aflição. A realidade não passa de um
concerto, embora os nossos ouvidos nem sempre estejam preparados para a
musicalidade que dela nasce. Olho para a rua e as árvores estão imóveis, estátuas
vivas de deuses cujos nomes esquecemos. Terei de sair e talvez quando voltar o
silêncio tenha regressado. A esperança não deixa de ser uma virtude, apesar de alguém
ter confundido as paredes com um bombo, em que bate numa cadência descuidada e
irritadiça. Uma ópera.
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