sexta-feira, 22 de novembro de 2019

A aceleração do tempo

As minhas sextas-feiras estão longe da perfeição. Começam com uma lentidão exasperante, com os segundos a arrastarem-se trôpegos e indecisos pelo caminho, quase incapazes de se transformarem em minutos, evitando o mais que podem que estes se combinem em horas, ronceiros a fazer gala na indolência, madraços subjugados ao pecado mortal da preguiça. Imagino que por virtude de um almoço revigorante, chegada a tarde, esses mesmos segundos são tomados por uma louca azáfama e dão em acelerar pela pista fora, como se tivessem por missão conquistar a pole position e saírem na frente da corrida. Nada lhes tolhe as pernas e quanto maior é a presteza com que passam, mais rápido se movem. Chegada a noite, cada minuto passa à velocidade de um segundo e não há sinalização de trânsito nem radar que os leve a amolecer o ímpeto. Se eu fosse um homem de engenho, apunhalava uns tantos, deixando-os a sangrar para que os outros segundos os vissem com olhos de ver e tomassem tento, aprendendo com Zenão e tornando-se em verdadeiros Aquiles que nunca hão-de alcançar a vagarosa tartaruga. Falta-me veia para executor e, dir-me-ão, arte para encontrar motivo para escrever coisas decentes, que animem o mundo ou edifiquem as gentes para que estas não entrem no caminho da perdição. Muitas são as vias que nos levam à loucura, umas mais lentas outras mais rápidas. Haverei de lá chegar.

2 comentários:

  1. E porque haverá de lá chegar?
    É assim tão importante chegar à loucura?
    🤔
    Maria

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    Respostas
    1. Importante não é, mas é uma possibilidade e com o passar do tempo cada vez mais possível.Seja como for, o narrador tem uma certa tendência retórica para a hipérbole.

      HV

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