quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Um belo livro

Tenho entre mãos o belíssimo livro de poesia de Ana Luísa Amaral, Ágora. Comprei-o há pouco e ainda não tive tempo para ler qualquer poema, mas a beleza do objecto, antes que a do espírito se manifeste, vem-lhe do corpo. Uma edição de capa dura, onde se reproduz a pintura Jacob lutando com o anjo, de Bartholomeus  Breenbergh, nascido em Utreque no ano de 1598. Cada poema é acompanhado pela reprodução de um quadro. Num deles, de Georges de La Tour, vê-se uma Madalena penitente, e todo o livro é um jogo de diluição de fronteiras ou de contaminação. A tarde parecia propícia para a leitura. Hoje não houve até agora ensaio do grupo de baile da escola aqui ao lado, mas um aspirador ruidoso teima em assegurar o asseio de um dos apartamentos do prédio. Também nas instalações da antiga agência bancária, prossegue uma batucada sem ritmo, que se repercute nas paredes e desagua em mim. Folheio o livro com cuidado e vejo as pinturas. Há duas Salomés, mas o que me prende os olhos é uma reprodução de Ecce Ancilla Domini, de Dante Gabriel Rossetti. Ali vejo tudo o que há de feminino numa mulher, mas esta minha frase precisa de ser censurada, pois os dias não correm de feição a considerações metafísicas. Enquanto a tarde desliza brandamente sob um céu mesclado de azul e cinza, eu fico a olhar com demora a escrava do Senhor. Afinal, o grupo de baile sempre tem direito ao seu ensaio.

2 comentários:

  1. Gosto da Ana Luísa Amaral e esse livro deve ser belíssimo.
    Poesia dela tenho aqui o Imagias (Gótica, 2002); poesia traduzida da Emily Dickinson (em que ela é especialista) tenho os Cem Poemas e os Duzentos Poemas (Relógio d'Água).
    Mas fui enganada...
    Já tinha o primeiro livro e quando encomendei o segundo, uns anos depois, pensei: "Que bom, mais 200 poemas da Emily" e encomendei o livro apesar de ser muito caro (22€).
    Mas ao recebê-lo constatei que eram os 100 que eu já tinha mais outros 100, ou seja, o livro que eu já tinha ficou sem préstimo algum.
    É a vida...

    Boas leituras, HV, de preferência sem ruídos (terrível, não é?).

    ⛏🔨🛠🔊🎤📣🎙
    Maria

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    Respostas
    1. A poluição sonora não é a das menos graves.

      O livro com o título Ágora parece ser uma meditação sobre a Grécia. Puro engano, com excepção do 1º poema, todo ele é uma meditação poética sobre o Antigo e o Novo Testamentos. O 1º poema tem por título O Velo de Ouro e é o único que se liga à Grécia. O 2º poema, na verdade o 1º, tem por título Anunciação. O livro é belíssimo.

      HV

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