sábado, 15 de abril de 2023

Confissão

Passei os olhos pela imprensa online. É um acto memorial. Em tempos, a manhã de sábado era dedicada, numa esplanada, à leitura dos semanários. Por norma, três ou quatro, conforme a sorte deles. Depois, fiquei concentrado em apenas um e hoje zero. Já não frequento esplanadas nem leio semanários, seja em papel ou online. A informação e a opinião, de que fui grande consumidor, hoje, com raras excepções, entendiam-me. Imagino, agora, que me deveriam ter entediado desde sempre, pois, na verdade, apenas tocam a espuma dos dias. O problema é que a espuma que agora parece interessar o mercado de leitores e, por isso, os mercadores de informação é mais rasteira e mais suja. Há quem esteja pronto para dizer que os protagonistas são mais sujos e rasteiros. Pode ser verdade, mas julgo que o problema está do lado dos consumidores. Eles, sim, parecem-me cada vez mais ávidos de sujidade e de rasteirice, como se a alma das pessoas se tivesse vindo a tornar mais negra e desejosa do pior. Foi isto que disse ao padre Lodo, há pouco, em conversa ao telemóvel. Não falávamos há semanas. Ele disse-me que estava numa esplanada a apanhar sol e ia lendo o semanário, cujo nome omito. E eu fiz-lhe aquela confissão. Sim, sendo ele padre, achei que poderia ouvir-me neste tipo de confissão, pois deverá ter treino suficiente para abarcar todo o género de confidências e declarações de gosto. Respondeu-me que não desistia do seu jornal de sempre, isto é, aquele que adoptou desde que chegou a Portugal, mas que compreendia o meu desencanto com a imprensa. Esta compreensão, julgo, foi uma forma de absolvição. Depois, trocámos opiniões sobre política, como nunca deixamos de fazer, mas essas omito-as, pois, como narrador, estou proibido pelo autor de manifestar qualquer inclinação que possa ter pelo assunto.

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