O dia parece o fruto de uma imensa tristeza. Cobre-se com um
véu de cinza e esconde-se em cada beco por onde ninguém passa. Acompanho-lhe o
sentimento, mas será mais assisado quebrar esta lealdade e arvorar um sorriso
como se houvesse razão para uma imensa alegria. Desdobro diante de mim as
tarefas que tenho de realizar ainda hoje e pergunto-me se isso serve para
alguma coisa. A consciência, porém, diz-me que a ocupação é o melhor remédio
para estados de alma escuros. Olho-a com desprezo, mas ela não se faz rogada e
vinca a sua opinião, exorbitando funções. Volto às minha tarefas. Com elas
componho um puzzle, encaixo, com paciência, as peças, rio-me se me engano.
Ontem descobri um conjunto de textos que noutra época me interessariam, agora
não sei o que fazer com eles. Leio-os, mas é tanto o enfado, que o melhor é
esquecê-los. Oiço Andreas Scholl num Stabat
Mater de Marco Rosano, um compositor italiano actual. Deixo-me surpreender pela
música, fujo do fascínio que o mesmo tema tem na composição de Giovanni Battista
Pergolesi. Há obras que têm uma luz tão intensa que lançam uma enorme sombra
sobre todas as outras. Rosano também não é capaz de fugir por completo ao sortilégio
do seu compatriota. Esqueço tudo isso e deixo a música vir sobre mim. A
tristeza daquela mãe, porém, redime-me da melancolia da tarde que agora começa.
Vou almoçar como se fosse um dia normal. Hoje é segunda-feira, dia 13 de Abril.
Os campos da escola ao lado estão vazios, os cedros continuam a crescer e os
pássaros cantam iludidos pelo calendário.
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