segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Uma questão de fidelidade

Enterneço-me com pouco, afinal. Ao abrir a caixa do correio, encontrei uma carta da operadora de comunicações. Franzi o sobrolho, mas não a abri de imediato pois não tinha óculos à mão. Chegado a casa, com a visão devidamente aumentada, li a comunicação. Ofereciam-me um cheque de 150 euros para gastar na respectiva loja. Foi aqui que fiquei enternecido. Afinal, ainda há operadoras de comunicações boas e caridosas. Com a emoção a fazer vibrar as cordas do coração, fui ler as condições, pois até os santos mais caridosos têm as suas condições para a prática do bem. Eles são santos, não são, como Kant, adeptos do dever pelo dever. Havia algumas sem importância, mas uma exigia-me mais 24 meses de fidelidade à operadora. Apesar de enternecido, rasguei o cheque. Depois, olhando para os despojos, perguntei-me se o meu coração terá tanta capacidade em enternecer-se quanta em evitar fidelizações. Talvez ele não seja inclinado a pôr-se ao abrigo do pecado da infidelidade ou não esteja disposto a ser fiel por uns miseráveis 150 euros. Não quis aprofundar a questão, peguei nos papéis e fui colocá-los no caixote da reciclagem. Temo o dia em que receba um pequeno embrulho da operadora. Será um anel de noivado e um pedido de casamento pela Igreja.

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