Não tarda e caminharei por dentro da realidade. Esta combina estranhas características, um misto de rameira e de alcaiota, onde os ademanes de prostíbulo e as estratégias do alcovito se fundem entre urros selvagens e longos desesperos. Ali cultiva-se a ignorância e há que ter punho de ferro para sobreviver. Por vezes, há quem caia em combate. Consta que as enfermarias estão cheias de feridos de guerra, gente mutilada pelos cantos, uma visão preparatória para a entrada no Inferno, onde Dante e o seu mestre ainda nos esperam, contrariamente ao que consta por aí. Como é habitual, a minha propensão para a hipérbole não se conteve e deixei transparecer o cepticismo contumaz com que envolvo tudo que tenha a ver com a realidade, a humana para ser mais específico. Desaconselham-me a descrença nessa realidade, pois, afirmam, vivemos no melhor dos mundos possíveis, ou se ainda não o é para lá caminha a grande velocidade, aquela que nos leva para o futuro. Esquecem-se, porém, que o único futuro certo que temos é a morte, mas sobre esta o melhor é seguir a máxima wittgensteiniana sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar, o que contraria a inclinação natural para a logorreia de que sofro. Com tantas citações eruditas, não fora eu o que sou, há muito teria evitado a corveia da realidade.
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