Um pastel de feijão. Estou
falar a sério, até um bolo trivial se tornou acontecimento digno de
registo, pelo menos do meu. A necessidade de fazer uma escritura levou-me a
Santarém, mesmo ao lado da Bijou, uma
das célebres pastelarias da cidade. Acabado o acto burocrático, não resisti e,
ao fim de mais de dois meses, comi um bolo de pastelaria, não dentro dela mas
sentado no velho largo do seminário, como se fora um hippie fora de tempo e de lugar. Fazer uma escritura também não
deixa de ser um assunto interessante. Parece uma reunião de um bando já com as
máscaras postas pronto para o assalto. Aquilo que é um encontro entre pessoas
de bem, mediado pelo representante da autoridade civil, que exercem a sua
vontade em comprar e vender tornou-se uma estranha mancomunação para onde se
vai disfarçado, temeroso, e de olhar desconfiado. O que um vírus faz às
relações sociais. Prevejo já uma avalanche de doutoramentos em Sociologia do
COVID-19, a que se hão-de juntar outros na Economia, na Psicologia e até na
Antropologia. Outro ritual novo e inusitado, também um óptimo campo de trabalho
para sociólogos e antropólogos, é a paragem numa estação de serviço de uma
auto-estrada para ir a uma casa de banho. Há agora todo um conjunto de licenças
a obter para se alcançar uma chave extraída de um sítio onde estava em
desinfecção, que logo se tem de devolver para ser de novo desinfectada. Não só
o mundo se tornou um lugar perigoso como um sítio onde haveremos todos de
enlouquecer, para gáudio dos psiquiatras e psicanalistas, que também não
estarão melhores do que os pacientes, mas têm mais experiência na arte do
disfarce. O que valeu fui o pastel de feijão, mesmo comido na rua, mesmo
transportando-me para o hippie que
nunca fui. Hoje é sexta-feira, dia 15 de Maio. Onde me encontro neste momento
há sol e ouvem-se pássaros, mas como tudo na vida também isso é passageiro. A
próxima vez hei-de comer uma bola de Berlim, mesmo que isso desencadeie uma
guerra com a balança ou me obrigue a uma declaração em favor do flower power. Até trautearei If you're going
to San Francisco / Be sure to wear some flowers in your hair.
Um pastel de feijão:) É coisa que não como há uns anos mas também sempre me agradaram, mais que as bolas de berlim, de cujo creme não gosto e embirro com aquele açúcar que têm por fora. Agora já o situo na lezíria:)
ResponderEliminarSempre achei que devia ter o Tejo por perto!
~CC~
Há bolas de Berlim sem creme, óptimas. Com creme é muito mais difícil encontrar. Quanto ao açúcar, nada a fazer faz parte como nas farturas.
EliminarSim, tenho a Tejo a uma dúzia de quilómetros, mas não vivo na zona da lezíria.
HV